A educação tem um papel fundamental na vida do ser humano, passamos boa parte da nossa vida na escola, iniciando pelo processo de alfabetização até à formação acadêmica, em cursos de graduação e pós graduação. Construímos relacionamentos por meio da interação social com professores(as), colegas de classe e demais atores presentes no contexto educacional, como porteiros(as), merendeiros(as), vigilantes, zeladores(as), supervisores(as) e diretores(as).
Em nossa memória de longo prazo, guardamos recordações de momentos ímpares que vivemos desde os primeiros anos da vida escolar. Quem não lembra lá na 5ª série, daquela professora divertida que fazia brincadeiras e dinâmicas ao final das aulas, daquele senhor de idade, que era o porteiro da escola e sempre recebia à todos com carinho e respeito, daquele professor que sempre levava os alunos para uma atividade escolar externa, ou ainda daquela diretora calma e paciente, que sempre lhe dava conselhos, na tentativa de orientar sobre seu comportamento na escola?
Situações como essas serviram de motivação ou reflexão para muitos alunos, que conseguiram dar novo sentido às suas vidas, enveredando por caminhos distantes das drogas e da marginalidade. Uma escola onde todos seus profissionais expressam a afetividade para com os alunos, desde o porteiro ao diretor, conseguirá superar os desafios de lidar com os alunos que possuem comportamentos inadequados. Porém, essa realidade não acontece com a totalidade dos alunos, principalmente quando se trata de alunos com dificuldades comportamentais, estes, por vezes não são bem vistos por alguns profissionais, que na maioria dos casos não tem o conhecimento necessário para lidar com as situações relativas àquele aluno, ou mesmo por falta de empatia.
Historicamente, o aluno com dificuldades comportamentais era tachado de rebelde, desinteressado, inútil, dentre outros tantos termos, sem contudo se investigar os reais motivos que levavam tal aluno a se comportar inadequadamente. Com as novas pesquisas e estudos da Psicologia, Pedagogia, Psiquiatria e a recém chegada Pscicopedagogia, novos conceitos e diretrizes nortearam a forma de como devemos lidar com as situações comportamentais dos alunos no ambiente escolar, razão pela qual se faz necessário a formação continuada nas redes de ensino, bem como o interesse de cada profissional da educação em buscar novos conhecimentos e habilidades de modo a adaptar-se às novas realidades e tendências educacionais.
No decorrer da história, os alunos que tinham dificuldades comportamentais eram, literalmente excluídos do processo educacional, através de transferências que eram lançadas no boletim do aluno, em caneta vermelha, tal procedimento significava que aquele aluno não possuía um comportamento adequado e poderia ser um “perigo” à escola que o recebesse, era como uma “pena de morte”, pois quando isso ocorria, aquele aluno tinha dificuldade para conseguir vaga em outro estabelecimento de ensino, ou era discriminado antes mesmo de ser inserido na escola. Sem uma vaga na escola, fatalmente o aluno ingressaria na marginalidade, diante da ociosidade pelo afastamento escolar e pela rejeição sofrida, que poderia resultar na sua revolta trazendo consequências irreparáveis. Dificilmente esses alunos recebiam um acompanhamento profissional de modo a desvendar as razões que o levavam a ter comportamentos inadequados em sala de aula.
Com as mudanças no contexto social e as evoluções pelas quais passaram nossa sociedade, o processo de educação também teve que acompanhar essa realidade. Passamos por inúmeros processos até chegar ao da Inclusão, porém, não foi fácil chegar a este patamar, muitas pesquisas e esforços de teóricos fizeram com que novas perspectivas surgissem e dessem outra oportunidade àqueles alunos com dificuldades comportamentais.
Como profissionais da educação, precisamos compreender quão grande importância temos no processo de construção de cidadania na vida de muitas crianças e adolescentes, devemos desenvolver nossa afetividade e empatia de modo que todos os alunos se sintam valorizados, e, com isso, tenham motivação para um aprendizado mais significativo, pois “todo trabalho envolve algum investimento afetivo por parte do trabalhador, quer seja na relação estabelecida com outros, quer mesmo na relação estabelecida com o produto do trabalho” (CODO; GAZZOTTI, 1999, p. 50).
Um dos teóricos que trouxe grandes contribuições e descobertas ao processo de educação foi o médico Belga Ovide Decroly. Sua infância foi marcada por muita indisciplina, chegando a ser expulso de vários colégios em que estudou. Diante disso, fica a reflexão: Se todos tivessem fechado as portas para Decroly, impedindo-o de continuar nos estudos, teria ele trilhado os rumos da medicina? Ou seria mais um lançado nas tristes estatísticas do analfabetismo e marginalidade? Assim como Decroly outros teóricos nos trazem importantes ensinamentos como John Dewey, Maria Montessori e Anisio Teixeira que idealizam uma escola onde deveria ser ensinado a criança a viver no mundo, defendendo concepções para além do simples acúmulo de conteúdos.
A história de Decroly muito se assemelha à minha realidade, pois quando estudante do ensino fundamental, também fui transferido compulsoriamente de duas escolas, por não apresentar um comportamento adequado às regras escolares, contudo, diante de algumas portas que permaneceram abertas, tive a oportunidade de aprimorar conhecimentos que foram fundamentais para minha transformação e formação cidadã.
Com essas experiências, objetiva-se fomentar nos docentes contemporâneos e profissionais da educação o desejo por nutrir maior afetividade para com seus alunos, em especial aqueles que apresentam dificuldades comportamentais, pois, a forma como lidamos com eles podem ser cruciais no direcionamento de suas vidas, uma vez que nossa missão como professor é preparar o aluno para viver em sociedade e não apenas para a vida profissional.
Sobre o Autor: Marcus Periks Barbosa Krause, Pedagogo e licenciado em Letras, especialista em Língua Portguesa com ênfase em gramática (FLATED), especialista em Educaçação Especial Inclusiva ( UEMA) e especialista em Dependência Química. Mestrando em Educação Especial Inclusiva (UEMA). Professor, servidor do MPMA, escritor e vice-presidente da Academia Pedreirense de Letras.
Matéria publicada no Jornal Pensar a Educação em Pauta da UFMG
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